Um belo
dia saí, assim como tantos outros, estou em uma loja e ao fundo vejo pessoas.
Elas conversam entre si. Num primeiro momento sigo fazendo o que saí disposta a
fazer, comprar algo que faltava em casa, mas de repente aquela conversa
desperta minha atenção e já não consigo sair sem ouvir mais um trechinho da
conversa. Curiosidade? Nããão...falavam das escolas, de que se antes os alunos
não aprendiam imagina agora? De que achavam um absurdo “a professora” receber
sem fazer nada. Fiquei mais um pouco para ouvir mais destes absurdos
afinal...como discutir com quem não está na nossa pele. Olhei atentamente os rostos que ali estavam a
desmerecer os esforços de tantos e nem falo só de mim, fiquei querendo levá-los
até minha casa para observarem as horas que passo pesquisando, organizando e
planejando o que meu aluno vai receber. Queria levá-los até a casa dos meus
alunos, mostrar à eles a dedicação dos responsáveis e de “minhas” crianças as
quais semanalmente visito na escola, levando atividades, jogos e buscando o que
por eles fora feito para corrigir. A quem
não conhece nossas lutas, não dou o direito às críticas. Quem não sabe que para
muita coisa ser feita, pego do meu dinheiro para comprar material, pois não
quero deixar ninguém de fora, que minha escola desde o começo atendeu ao meu
pedido e concordou que na falta de internet para todos, faríamos as aulas
impressas, que na escola se faz pão, se doa máscara, se faz vaquinha e tudo
mais para que as coisas funcionem, também não dou direito de criticar. Para
aquele que não sabe que tenho aluno que mal tem roupa, comida ou até lhe falta
uma mesa para fazer seus trabalhos, nem vou comentar. Falar dos outros parece
fácil, ser o cara que conserta moto, o ajudante da padaria, o vendedor da loja
ou só o fofoqueiro da cidade, não dá o direito de falar de algo que desconhece.
Estou na luta, na tentativa de acertar cada vez que sento pra planejar afim de
que meu aluno ainda que eu esteja longe, consiga aprender o que precisa nestes
tempos difíceis e ao mesmo tempo se sinta acolhido dentro da proposta de
atividades. Meus heróis? Sim, meus pequenos guerreiros, não vestem capa, vestem
roupas simples, moram em lugares simples e me fazem amar minha profissão. Mandam-me
mensagem pra falar de saudade, mostrando suas conquistas, mostrando um pouco do
seu dia a dia e por várias vezes pra dizer que tem saudade da escola e dos
colegas. Meus heróis são gente simples, alguns de 6, outros de 7, outros de 30
e poucos ou até de 50 anos. São os meus alunos, suas mães, suas tias, suas
dindas e seus avós, são aqueles a quem vivo elogiando a persistência, pois
estão a desempenhar alguns papéis que outrora seriam meus. Conversamos dia e
noite, sim! Eu disse dia e noite, no tal “watts” que tem sido nossa ferramenta
freqüente e quem nos aproxima nestes tempos difíceis. Questionar o que temos
sido capazes de fazer nestes momentos não me parece muito gentil, mas vamos lá...
na semana passada, trabalhamos uma história, “ A cesta da Dona Maricota”, o
planejamento falava nas vogais, encontros vocálicos, trazia cálculos, a pirâmide alimentar e um
desafio -> plantar e cuidar de um feijão. Como tudo acontece? Planejo a aula
e envio para a escola para ser impressa. Preparo o kit de cada aluno (um pouco
de algodão, um copinho plástico e 2 feijões). Combino com o pessoal o dia e a
hora da entrega na escola e lá vamos nós! Moro a uns 30 km da escola, me
organizo para chegar mais cedo, minha coordenadora, Viram Berté, já está lá, imprimindo
as atividades para quando eu chegar, organizar nas sacolinhas e entregar. Minha
turma de 1º ano é uma das mais assíduas em termos de entrega e retirada de
atividades. As crianças geralmente não comparecem, pois nossa saudade a gente
mata no “watts”. Os responsáveis comparecem, trocamos informações que
consideram importantes e que não foram colocadas em mensagens, conferimos o que
veio e o que vai e lá vamos nós. Já estamos naquela fase onde andam se
perguntando “o que será que vem?” pois cada semana preparo junto das atividades
o tal “kit”, que é pensado com carinho para que a atividade seja lúdica e todos
possam fazê-la. Lá da
conversa inicial, no começo do texto, o que mais me chateou, foi em poucas
palavras de gente que nem conhece o que se passa, falar e achar que tem
propriedade para discutir tais assuntos. Quando se fala de EMPATIA, procuro e
geralmente consigo me colocar no lugar de muita gente, no lugar da enfermeira
que exerce sua atividade com carinho embora dentro de si more o medo do que
pode acontecer, do médico que deixa sua família muitas vezes em segundo plano
para atender as demandas do momentos, da caixa do supermercado que pega cédulas
e moedas com receio de adoecer, de muitos mas muitos mesmos e aí pergunto: por
que acham que professor recebe sem trabalhar? Nunca se trabalho tanto e quando
falo em trabalhar, falo em se reinventar...tá ruim em casa administrando tudo
isso com o filho? Por aqui, do outro lado, lado do professor, não está
diferente! Sempre
digo aos que são da minha turma e que atendo, que são verdadeiros heróis e que
embora não vistam capa, suas máscaras trazem estampadas a necessidade de
cuidarmos uns dos outros para ficarmos bem. Afinal,
nem todo herói veste capa, mas todo herói sabe o valor da palavra EMPATIA, pois
se a dor do outro não dói em você, você é parte do problema!
Andréia Francisca dos Santos
Professora do 1º ano da EEEM SANTO ANTÔNIO,
bairro Santo Antônio, Lajeado